Vir à Natal e não encontrar Lenício, ainda é muito doloroso pra mim. Sinto falta dos nossos encontros, dos nossos bate papos, sempre regados de muita alegria, de muito carinho. Lenício era um amigo querido que conheci ainda moleque, quando morou na minha rua. Adolescente foi meu aluno no Instituto Padre Monte, onde dividia sua vida de estudante e a de funcionário da Fundação José Augusto. Tempos depois nos encontramos nessa mesma Fundação, eu como estudante do curso de Sociologia, ele como Secretário da Faculdade. Nos aproximamos muito nessa época e partilhamos muitas alegrias e muitas tristezas. Anos difíceis aqueles, anos duros marcados pela ditadura. Lenício nessa período agia como meu anjo protetor, me aconselhando e me dando dicas importantes sobre a presença dos militares infiltrados na faculdade. Como eu sou grata a ele, hoje à sua memória, pelos cuidados que tinha comigo!
Voltamos a nos encontrar no Rio de Janeiro quando ele foi cursar Artes Cênicas pela Escola Superior de Teatro da Universidade do Rio de Janeiro. Nem preciso falar da minha alegria de ter novamente o meu amigo perto de mim. Acompanhei sua trajetória nessa cidade e toda a sua luta para se tornar um grande ator. E com certeza, tudo o que ele conseguiu nessa cidade, com muita garra, coragem e determinação, foi muito importante para a sua projeção no cenário nacional.
Artista por vocação e sempre carregando o teatro na alma, Lenício se orgulhaca muito do que fazia, desde que voltou para Natal. Hoje quando releio tudo o que se diz sobre ele e tudo o que ele fez pela cultura da sua cidade, sinto também muito orgulho de ter tido o privilégio da sua amizade.
Essa postagem no Vento Nordeste é a minha homenagem a esse amigo querido, essa pessoa generosa, esse ator maravilhoso, que saiu de cena de forma tão precoce. Fico na torcida para que seu nome nunca seja esquecido e seja gravado para sempre entre aqueles que fizeram a cultura desse estado. Saudades amigo!...
"Quando o ator Lenício Queiroga se retirou dos palcos da vida, no dia 21 de fevereiro de 2009, aos 58 anos de idade, era, por ironia ou fatalidade, um sábado de carnaval. A data se esboroou nas névoas do tempo. Lenicio, porém, deixou na memória de uma geração de natalenses as lembranças mais vividas do que fora a dramaturgia nos tempos da cólera "manu militari". Sua encarnação antológica da professora histriônica e autoritária na peça "Apareceu a Margarida" de Roberto Athayde, na ribalta do TAM, alçaria voo para outros palcos em sentido descendente na geografia do país, conquistando prêmios e consagração popular" (elson Patriota - Crônica "Chão dos Simples"- do livro ao palco)
Natural de Natal o ator, diretor e crítico de teatro professor e dramaturgo Lenício Queiroga, era formado em História pela UFRN. Trabalhou em diversos órgãos e setores ligados a educação, entre os quais a TV universitária. Formado também em Artes Cênicas pela Escola Superior de Teatro do Rio de Janeiro, onde morou por muitos anos. Participou e coordenou diversos festivais e premiações nacionais, tais como "Troféu Mambembe", "Concurso Nacional de Dramaturgia" e Prêmio Estímulo de Teatro". Recebeu 12 prêmios nacionais por sua atuação na peça "Apareceu a Margarida".
LENÍCIO QUEIROGA POR ELE MESMO
(Fragmentos da Entrevista Concedida ao Correio da Tarde em 2008)
"Comecei a fazer teatro em 1971 no Teatro Novo Universitário ( TONUS) pelas mãos do diretor Carlos Furtado. Nessa época cursava História na UFRN. Minha primeira montagem foi "Inspetor Geral" de Nikolai Gogol e fui aplaudido de pé quatro vezes em cena aberta. Dasí passei a ser visto e vi que aquilo era o que eu queria para a ,minha vida."
"Em 1976 criei o Grupo Aquarius de Teatro e montei o espetáculo de maior sucesso na minha carreira "Apareceu a Margarida" de Alberto Athayde. Considero essa a minha maior obra. Ganhei 12 prêmios nacionais, entre eles o Grande Otelo. Mambembe e Moliére. Foi o primeiro espetáculo da história dio Rio Grande do Norte a percorrer o país de 1977 a 1883. Fiz 1.438 apresentações. Montei outros espetáculos também como "Os Andantes" de Jobel Costa, Dirigi "Ponto de Partida" de Gianfrancesco Guarnieri,No elenco estavam grandes atores da nossa terra, como Fernando Athayde e Kinha Costa"
"Quando fui morar no Rio de Janeiro, tive oportunidade de conhecer outras coisas além de atuar. Fiz o curso de bacharelado e mestrado em teatro na Escola Superior de Teatro da Unirio. A minha turma tinha nomes como o de Moacyr Góis e Marco Nanine. A partir daí passei a lecionar, fiz concurso e passei a trabalhar na Fundacen do Minc, hoje Funarte,coordenando o departamento de teatro".
"No Rio, naquela época, era bem mais fácil entrar na TV Globo. Fiz muitos trabalhos lá: "Eu prometo" - última novela de Janete Clair e "Bandidos da Falange" - a primeira de Aguinaldo Silva. Mas televisão nunca foi minha praia, ao contrário do teatro e do cinema".
"Augusto Ribeiro Júnior, diretor do filme "Boi de Prata" entrou no meu camarim no Teatro Princesa Isabel no Rio, onde eu estava em temporada, e me convidou para fazer o filme.Achei que seria uma pontinha e acabou sendo o personagem principal. Inicialmente eu iria contracenar com Rejane Medeiros, grande atriz do cinema do nosso estado, porém acabei atuando com Luiza Maranhão, que veio diretamente da Itália. Filmamos em Caicó e no Rio de Janeiro. A crítica dizia que eu era a grande promessa do cinema nacional. Foi nesse momento que eu conheci o sucesso - estava com um filme em cartaz,uma temporada de sucesso do espetáculo "Apareceu a Margarida" e ainda participações em produções na Globo. Entendi que o sucesso é uma nuvem que passa e você tem que saber aproveitar.Ninguém mantém o sucesso para sempre. O que você faz é uma manutenção do nome. Eu posso dizer que tive meus quinze minutos de fama"
"Em 2006, Dácio Galvão e Olga Aranha me convidaram para o Auto, com o texto do meu amigo Ney Leandro de Castro. Topei o desafio de dirigir esse espetáculo tão grandioso.Criei uma concepção cênica de um Auto que destacasse o regional e o urbano, tornando-o leve e com uma hora de duração, para não cansar o publico, com sequências de cenas de beleza plástica e cronometrada. Tudo isso casando imagens e perfomances de atores com músicas que tenha a ver com o contexto. A repercussão foi a altura do que eu esperava. Até hoje se comenta que foi um dos melhores de todos os tempos".
Lenício Queiroga - O Dramaturgo
"Chão Simples" - única experiência "autoral" conhecida de Lenício Queiroga, é uma adaptação dos contos do escritor Manoel Onofre Jr. Levada aos palcos do Teatro Alberto Maranhão, com o mesmo nome do livro, no dia 27 de julho de 1977, com boa resposta do público. No ano seguinte a peça voltou a ser montada no mesmo teatro, sempre sob a direção de Lenício Queiroga.
A peça transformada em livro foi publicada por iniciativa do próprio escritor. "Ao publicar esse texto, Manoel Onofre Jr. dá uma contribuição singular ao repertório da dramaturgia potiguar, ao mesmo tempo em que retribui o esforço intelectual de Lenício, retirando-o de detrás das cortinas do olvido para o centro do palco, onde os holofotes podem projetá-lo como protagonista, sem demérito para o seu papel de diretor do espetáculo e, eventualmente, de ator e narrador". ( Nelson Patriota)
Lenício Queiroga e o TAM
Quando saiu de cena, Lenicio coordenava o Teatro Alberto Maranhão, e se sentia muito orgulhoso por isso. "Fico feliz das pessoas da minha terra me reconhecerem e a imprensa e os políticos me prestigiarem" - disse em entrevista. Sempre muito preocupado em ajudar os grupos de teatro da cidade, criou um fundo de auxílio montagem. Segundo ele , a ideia surgiu quando fazia parte da Comissão do Centenário do Teatro Alberto Maranhão (TAM) e a trouxe da Funarte, para dar vida a produção teatral da cidade que estava um marasmo. Era um auxílio a fundo perdido e não um patrocinio. Fizemos duas edições e foram montados 38 espetáculos. Hoje a Fundação José Augusto está operacionando o projeto.
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Fontes:
- Jornal Tribuna do Norte-Natal/RN
- Diário de Natal -Natal/RN
- Jornal Correio da Tarde - Mossoró/RN
- Nelson Patriota - Crônica publicada na Tribuna do Norte
Fotos:
- Imagens Google
- Edição de Fotos: site pic-Monkey